Textos Diversos

Reflexões sobre a comemoração da Páscoa

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Na Páscoa, os Cristãos festejam a ressurreição do Cristo, mas continuam usando o nome que era dado a uma outra comemoração da época pré-cristã. Porque não falamos em comemoração da ressurreição? Será que é porque a humanidade ainda não compreendeu o significado do Mistério do Gólgota em toda sua amplitude, como o acontecimento mais importante na evolução da Terra e da humanidade? Rudolf Steiner expõe numa conferencia de 19/4/1924 que a escolha da data para a ressurreição já foi um equívoco, uma incompreensão do seu significado real mais profundo.

A festa da Páscoa é a festa da ressurreição. Mas esta festa da Páscoa aponta para épocas muito mais antigas que a Cristã. Ela aponta a festas que se relacionam com a época do equinócio da primavera, com aquelas festas que se vinculam à natureza que está novamente acordando, com a vida que novamente surge da terra. E com isso, nós estamos no ponto onde se encontram as coisas que devem ser faladas e que constituem o tema destas palestras da Páscoa: a festa da Páscoa como um pedaço da história dos mistérios da humanidade.

A festa da Páscoa, como festa crística, é uma festa da ressurreição. A correspondente festa pagã que acontece aproximadamente na mesma época do ano em que acontece a festa da Páscoa, é uma festa da ressurreição da natureza, um reaparecer daquilo que forma natural, durante a época do inverno, se assim posso me expressar, dormia. E com isso chegamos ao ponto onde nós precisamos ressaltar que a festa crística da Páscoa não é uma festa que coincide segundo seu sentido interno e sua essência com as festas pagãs do equinócio da primavera, mas a festa da Páscoa pensada como uma festa crística coincide, se já queremos voltar para os antigos tempos pagãos, com antigas festas que emergiram dos mistérios e que aconteciam na época do outono. Em relação com a determinação do momento em que deveria acontecer a festa da Páscoa, que por seu conteúdo tem a ver muito claramente com um determinado tipo de mistério da antiguidade. Justamente esta festa nos lembra que confusões enormes e radicais aconteceram na concepção dos mais importantes coisas no decorrer da evolução da humanidade. Pois aconteceu nada menos que no decorrer dos primeiros séculos do cristianismo a festa da Páscoa foi confundida com uma festa totalmente diferente e por isso foi transferida de uma festa do outono para uma festa da primavera.

O surpreendente é que até os símbolos pagãos usados na festa do equinócio da primavera: o coelho como símbolo da fertilidade e o ovo como símbolo do inicio da viva, do vivo, estão presentes, com grande importância comercial, até hoje. O verdadeiro conteúdo da comemoração, a ressurreição do Cristo, desaparece atrás de coelhos e ovos de chocolate que estão completamente deslocados para nós que vivemos a realidade outonal no hemisfério sul.

A nossa natureza que reflete a influência cósmica do equinócio do outono, nos apresenta justamente um fenômeno que pode simbolizar os acontecimentos do Mistério do Gólgota: A transformação da lagarta em borboleta.

No livro “De Jesus a Cristo” Rudolf Steiner nos revela o significado profundo dos acontecimentos no Mistério do Gólgota, do sacrifício do Cristo para redimir o Pecado Original, possibilitando a ascensão, o direcionamento da humanidade rumo a uma espiritualização.

“Em compensação, não existe a possibilidade de se apagar, por um feito humano, um acontecimento ocorrido fora da História e não pertencente à humanidade, tal como ocorreu com a atuação luciférica na antiga época lemurica. Pelo acontecimento luciférico, o homem se beneficiou de grande dádiva de tornar-se livre; de outro lado, teve que pagar o preço de ficar sujeito a desviar-se do caminho do Bem e do Cristo, e também do caminho da Verdade. O que começou a atuar no decurso das encarnações é um assunto do carma; mas tudo o que penetra no Macrocosmo no microcosmo, tudo o que os seres luciféricos deram ao homem, constitui algo que o homem não consegue superar sozinho. Para compensá-lo, é preciso um feito objetivo. Numa palavra: o homem deve sentir que algo meramente subjetivo na alma não basta para redimi-lo, já que os erros e pecados cometidos tampouco são apenas subjetivos.”

“Nesse momento ocorreu o Mistério do Gólgota, tal como o caracterizamos, e com ele aquilo que fica tão incompreensível à inteligência vinculada ao corpo físico dotado, em maior parte, das forças destrutivas. Aconteceu que um homem, o portador do Cristo, passou por uma morte tal que desapareceu o elemento perecível do corpo físico e se ergueu do túmulo o corpo que sustenta dinamicamente os componentes físicos e materiais. O que os regentes de Saturno, do Sol e da Lua haviam destinado ao homem foi o que emergiu do túmulo: o puro fantoma do corpo físico, com todas as propriedades deste. Com isso foi realizada a possibilidade de existir a genealogia espiritual que mencionamos. A visão do Cristo ressureto do túmulo permite-nos imaginar o seguinte: - Assim como os corpos perecíveis dos homens descendem do corpo de Adão, os corpos espirituais – os fantomas- descendem, para todos os homens daquele que se elevou ao túmulo. A eles é possível estabelecer com o Cristo uma relação que permite ao homem receber em sua organização as forças que então ressurgiram, da mesma maneira com ele recebera, devido às forças luciféricas, a organização adâmica em seu corpo físico.”

A espiritualização do corpo de Jesus, a transubstanciação, foi o ato do Cristo para redimir o Pecado Original. A partir do momento em que ocorreu este feito aqui na Terra, com um corpo humano terreno, foi aberta a possibilidade para que o processo de espiritualização do corpo físico esteja ao alcance de qualquer ser humano que queira seguir Cristo com todas as forças do coração.

A transformação da lagarta em borboleta também é uma forma de transubstanciação. A lagarta sai do ovo da borboleta e começa a comer folhas, come sem parar e cresce rapidamente. De repente pára de comer, deixa a planta que lhe serviu de alimento e vai procurar um lugar abrigado para se transformar em crisálida ou tecer seu casulo. Na crisálida a lagarta se desfaz tornando-se uma gelatina amorfa que começa a se reestruturar em um ser totalmente diferente, leve e colorido. A mesma matéria corpórea, uma vez pesada, rastejante e depois leve esvoaçante.

A mariposa que acaba de nascer Rodolf Steiner falou bastante sobre a borboleta e principalmente em conferências que se encontram no livro “Der Mensch als Zusammenklang dês schaffenden, bildenden und gestaltenden Weltenwortes”, GA 230. Um aspecto surpreendente sobre a borboleta, a mariposa e os insetos em geral, é que estes já vêm participando da evolução da Terra e da humanidade desde o antigo Saturno. “...o mero sentimento que é suscitado pelo mundo dos insetos esvoaçantes cintilantes nos revela sua ligação com o que está acima, com as característica aéreas saturninas e solares. (Saturno – calor, Sol – luz). Isso também acontece quando olhamos para a borboleta com suas cores vibrantes.” Rudolf Steiner continua caracterizando a borboleta como um ser ligado ao ar e a luz, que tem características solares, que é um ser inteiramente entregue ao Sol, à luz, ao calor. Sua atração pela luz é tão forte que ela se entrega, atirando-se na luz das chamas cujo chamado é irresistível e mortal para as borboletas, as mariposas, os insetos em geral. A vida e o desenvolvimento da borboleta são regidos pelo Sol com a ajuda das influencias de Marte, Júpiter e Saturno. Temos de compreender que a influência solar não se restringe apenas ao locar onde sua luz e seu calor incidem diretamente. A atuação do Sol sobre a Terra é muito mais ampla. Ele atua no lugar escolhido pela borboleta para depositar seus ovos, na planta da qual a lagarta se alimenta, e depois, na formulação da crisálida ou do casulo até a transformação em borboleta. Isto só pode acontecer pela influencia solar na Terra com a participação da influencia de outros planetas em determinados estágios da transformação.

Rudolf Steiner caracteriza a borboleta como um ser pouco materializado: “...De fato, quando olharmos as asas da borboleta, temos diante de nós matéria terrena espiritualizada.” “...até é possível ver espiritualmente como a borboleta despreza, de certo modo, seu corpo que se encontra entre suas asas coloridas; toda a atuação, toda a característica da alma grupal é como usufruir alegre das cores de suas asas.”

“... a borboleta é um ser de luz que voa. A ave voa pelo ar, mas seu elemento é o calor do Sol.”

“... Já mencionei que a borboleta, em verdade, é um ser de luz que durante toda a sua vida envia ao cosmo matéria terrena espiritualizada. Denominarei esta matéria espiritualizada que é enviada ao cosmo com um termo usado na física solar, como ‘auréola de borboleta’. Portanto, a auréola de borboleta vemos que as aves entregam cada vez que uma ave morre. Visto de fora, do ponto de vista espiritual, vê-se uma auréola brilhante que tem origem nas borboletas – sob a atuação de leis específicas ela se mantém também durante o inverno – que é atravessada por raios que são irradiados pelas aves que morrem. Vejam, quando o ser humano se prepara para descer do mundo espiritual para o mundo físico, o que em primeiro lugar chama para a existência terrena é a auréola de borboleta, a irradiação peculiar da matéria terrestre espiritualizada...”

“... De certo modo, a Terra atrai o ser humano para a reencarnação mandando para cima, para o espaço cósmico, as irradiações luminosas da auréola de borboleta permeada pelas irradiações das aves...”

 

Que bela imagem para a alma que quer comemorar a festa da ressurreição. A Terra envolta pela auréola de borboleta permeada de raios luzentes vindos das aves, auréola essa que é constituída de matéria espiritualizada Ao lado, a imagem do Cristo ressurreto, agora em forma de fantoma por ter espiritualizado o corpo físico. A natureza realmente contribui para que possamos compreender e vivenciar a festa cristã da ressurreição com mais profundidade.

 

Um mistério na Natureza

 

Olha a planta.

Ela é a borboleta

Presa a Terra

 

Olha a borboleta,

Ela é a planta

Liberta pelo cosmo.

                                                                                                              R. Steiner

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